quinta-feira, 5 de março de 2015

Diário de Uma Gravidez - 8 de agosto (Por Antonella Yllana )


É de manhã, decido ir ao centro para pegar dinheiro. Aproveito para entrar em uma farmácia e comprar um teste de gravidez.

A vez mais recente que fiz isso foi alguns meses atrás. Minha menstruação atrasou por alguns dias. Comprei o teste, fui a um banheiro público e não falei a ninguém sobre isso. O resultado deu negativo, o que me fez sentir uma mescla de alívio com desapontamento. Isso me surpreendeu. Não esperava ficar desapontada. Será que uma parte de mim realmente quer engravidar? Sei que tirei o DIU em novembro e me abri a todas as possibilidades. Já passaram mais de seis meses. Estou fazendo um tratamento com acupuntura, mas é como se eu não acreditasse realmente que eu possa engravidar. Afinal, há tantas razões para não ir nesta direção! Por exemplo: não tenho nem estabilidade financeira nem emocional.

É verdade que meu relacionamento com Florencio ainda tem momentos maravilhosos, mesmo depois de doze anos juntos. Nosso amor é romântico, intenso e profundo. Ele sobreviveu a todas as crises e me fez, pela primeira vez, me abrir à possibilidade de ter um filho. Até hoje, somos amigos, namorados e amantes, temos longas conversas que vão até altas horas da noite. É uma interação tão bela que superou todas as monstruosas dificuldades do caminho. Será ter filhos apenas mais uma dessas dificuldades, ao mesmo tempo que, também, uma dádiva sem igual? Muita gente diz isso e não duvido que o seja mesmo. Além disso, não seria a maternidade uma possibilidade de agradecer à vida tudo que ela fez por mim, fazendo isso por outra pessoa?

Por outro lado, nas horas difíceis, muitas vezes não sinto como se tivesse suporte emocional. Sinto-me sozinha, como se pudesse apenas contar comigo mesma. Talvez essa instabilidade mude com um filho, mas não é encorajador que tenha sido assim até agora. Com toda a certeza, sei que a maternidade não é apenas uma experiência bacana. É tanto um nascimento de uma nova vida quanto uma morte de tudo aquilo que foi antes. Confesso que tenho um medo absurdo disso, até mesmo porque não consigo achar amor em mim pela minha própria infância. Durante muitos anos, não gostava de me lembrar da criança que eu havia sido. As lembranças da infância sempre tiveram algo de doloroso para mim. Eu não entendia o mundo adulto, as brigas entre meus pais, as guerras na televisão, a devastação das florestas, entre muitas outras coisas que ninguém sabia me explicar, e me escondia atrás de meus livros e sonhos. Além disso, eu usava óculos, aparelho nos dentes e era gordinha, o que era razão suficiente para ser vítima de bullying na escola. Eu me lembro de ter sido uma criança chata, séria e triste, que não gostava muito da vida nem de si mesma.

Enfim, quando o primeiro teste de gravidez deu negativo, resolvi não pensar muito mais sobre o assunto nem comentar a respeito com ninguém. Desta vez, minha menstruação está uma semana atrasada e tenho me sentido um pouco estranha. É como se eu estivesse à flor da pele, mas não da maneira que normalmente fico antes de menstruar. É ainda mais vasto e profundo. Como se o eixo do mundo estivesse sendo deslocado.

Vou até um café, peço um cappuccino e um pão de queijo. Depois de comer, levanto e me encaminho ao banheiro, no fundo do recinto. Chego ali e realizo a conhecida coreografia de urinar sobre o bastãozinho. Depois disso, calculo cinco minutos no relógio e começo a esperar. Provavelmente, não estou grávida, mas é bom me certificar de que não estou mesmo. Penso em algumas coisas que quero fazer hoje, olho distraidamente para o espelho, arrumo uns fios de cabelo que sempre estão fora do lugar, retoco o batom. Observo o espaço à minha volta. É um banheiro bastante limpo, o que para mim é sempre um bom sinal em um estabelecimento público. O relógio diz que passaram 4 minutos. Vejo um fio vermelho mais denso e outro mais apagado. Meu coração começa a bater rápido. Vou esperar mais dois minutos. Algo deve estar errado. Encosto meu peso contra a porta. Uma luz clara entra pela janela lembrando que lá fora o sol está brilhando com toda força. Fecho os olhos e respiro fundo algumas vezes. Sei que na vida tudo sempre pode mudar em um segundo. Posso atravessar a rua e ser atropelada. Uma chuva de bênçãos pode cair do céu.

Abro os olhos de novo e seis minutos passaram. O segundo fio vermelho está mais forte ainda... Estou grávida. Estou grávida? Estou grávida!!!

Olho para o espelho e seguro o rosto entre as mãos. Algumas lágrimas escorrem. Coloco o resultado na bolsa, olho uma última vez com incredulidade para este rosto que está migrando rumo a uma metamorfose crescente e absoluta sem eu nem mesmo perceber, enxugo minha face e saio para o mundo. Caminho um pouquinho rumo à Igreja que fica ali perto. Entro e me ajoelho diante da Nossa Senhora D`Ajuda. Hoje, presto muita atenção ao fato de que ela está segurando um bebê nos braços. O filho do Amor. Deixo o coração galopar solto pelos campos das emoções incandescentes. A vida sempre consegue me surpreender.




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